quinta-feira, 19 de março de 2009

Greenpeace: Bhopal, o descaso continua...

São Paulo (SP), Brasil — Mais de 17 anos após a tragédia, os números são assustadores: 20 mil mortos e mais de 100 mil vítimas, a história se repete ano após ano.

Flores e som de cítara marcaram um protesto diferente que envolveu 25 ativistas da organização ambientalista Greenpeace, representantes da ACPO (Associação de Combate aos POPs) e pescadores da UNIPESQ (União dos Pescadores de Conceiçãozinha, no Guarujá). Os manifestantes fizeram uma cerimônia em solidariedade às mais de 100 mil vítimas de Bhopal, em frente a sede brasileira da empresa Dow Química, em São Paulo.

Os ativistas cobriram a entrada principal da empresa com flores coloridas, simbolizando as vítimas de um dos maiores acidentes químicos da história. Uma placa de metal foi fixada na entrada principal da empresa lembrando o número de pessoas afetadas e com uma pergunta: “ Dow, até quando? “ Uma apresentação de cítara, instrumento musical tradicional indiano, foi realizada pelo músico Luciano Sallun e teve como público parte dos funcionários da empresa.

A organização ambientalista Greenpeace enviou ontem, dia sete de maio (1), cartas aos principais executivos da Dow Química no mundo, para que se pronunciassem favoravelmente ao processo de descontaminação e promovessem a justiça para as vítimas de Bhopal, durante a Reunião Geral de Acionistas (AGM) que será realizada amanhã na cidade Midland, no Michigan, sede mundial da empresa nos Estados Unidos. Protestos em solidariedade às vítimas estão acontecendo na sede regional européia, na Suíça, e na sede asiática, em Hong Kong.

Na madrugada de 03 de dezembro de 1984, mais de 500 mil pessoas foram expostas a um coquetel de gases letais que vazaram da fábrica de agrotóxicos da Union Carbide (hoje pertencente à Dow Química) em Bhopal, na Índia. Mais de 7,5 mil pessoas morreram na noite do desastre. De acordo com a rede AaCcTt (2) e comunidades locais, hoje, o número de vítimas fatais ultrapassa os 20 mil. São contabilizados em mais de 100 mil o número de pessoas da região que sofrerem com os efeitos da exposição crônica aos gases, manifestados em doenças pulmonares, coronárias, neurológicas e nos olhos, além de provocarem sérios distúrbios nos sistemas imunológico, hormonal e reprodutivo. A população necessita constantemente de atendimento médico, que é inexistente. Segundo dados oficiais, a cada mês que passa, mais um sobrevivente do desastre morre por doenças relacionadas à exposição.

Logo após o acidente, a Union Carbide abandonou a fábrica, deixando para trás toneladas de lixo tóxico. Assim, nos últimos 17 anos, o lençol freático que abastece a cidade vem sendo contaminado. Dessa forma, a comunidade, sem escolha, vê-se obrigada a consumir esta água todos os dias, ingerindo um coquetel de substâncias tóxicas, que inclui clorobenzeno, clorofórmio, tricloroetano e tetracloreto de carbono. Em 1999, uma pesquisa do Greenpeace revelou níveis de contaminação muito acima dos padrões para água potável aceitos pela EPA-US (do inglês, Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos). Os níveis de tetracloreto de carbono são 682 vezes superiores aos permitidos pela agência norte-americana; os de clorobenzeno, 11 vezes; os de tricloroetano, 50 vezes; e os níveis de clorofórmio superaram em 20 vezes os padrões dos Estados Unidos.

Em fevereiro de 2001, a Union Carbide foi incorporada pela multinacional americana Dow Chemicals. A transação comercial envolveu cerca de US$ 9,3 bilhões, criando a segunda maior companhia química do mundo. “O fato de a Dow ter comprado a Union Carbide não mudou em nada a necessidade de descontaminar Bhopal e de garantir o tratamento médico aos sobreviventes. De acordo com a legislação norte americana, à qual a sede internacional da Dow está sujeita, a mudança de dono não retira da indústria a responsabilidade pelo passivo ambiental adquirido. É inadmissível que a Dow adote um padrão de conduta dentro dos Estados Unidos e outro fora.” diz Karen Suassuna, coordenadora da campanha de Substâncias Tóxicas do Greenpeace. “Os acionistas da Dow devem se questionar se é ético uma empresa dispender tanto esforço para construir uma imagem pública e ao mesmo tempo demostrar tanto descaso com o sofrimento imposto à população”.

O protesto, que contou com o apoio de organizações brasileiras formadas por vítimas de contaminação, também serve para lembrar às autoridades nacionais e ao setor industrial que casos semelhantes ao de Bhopal também acontecem aqui. Assim como as vítimas indianas, brasileiros também sofrem com a contaminação ambiental e danos a sua saúde causados por contaminantes químicos oriundos de processos industriais. Empresas como a belga Solvay, a gigante Shell, de capital britânico e holandês, a francesa Rhodia, dentre outras, são responsáveis por boa parte da herança tóxica brasileira (3). “Minha vida hoje depende de medicamentos e é por isso que estou aqui, prestando minha solidariedade àqueles que já se foram e aos que como eu se tornaram para sempre vítimas de uma ação irresponsável da indústria química” diz Márcio Pedroso, contaminado por mercúrio e membro da organização brasileira ACPO (Associação de Combate aos POP’s) com sede em Santos, no estado de São Paulo.

Em janeiro de 1998, o Greenpeace denunciou a contaminação por tetracloreto de carbono e clorofórmio encontrados nos efluentes da planta da Dow, localizada no Guarujá , no estado de São Paulo. A postura da companhia foi negar a possibilidade de dano ambiental. Mesmo após dois anos da denuncia, a Dow recusa-se a pronunciar-se publicamente sobre o assunto. “Os peixes sumiram, a água está contaminada, não tenho mais de onde tirar meus sustento como pescador, Hoje luto por um futuro melhor para meus filhos, não quero dar a eles a vida que tive, vendo a minha maior riqueza, o estuário do Guarujá, ser destruído pela poluição”. Newton Rafael Gonçalves é pescador caiçara, secretário geral da UNIPESQ e morador a mais de 44 anos do síto Conceiçãozinha, fundado em 1898 e localizado ao lado da planta da Dow Química no Guarujá, litoral do estado de São Paulo.

A forma com a qual a Dow lida com a tragédia de Bhopal está servindo como modelo de negligência para os demais “casos Bhopal” espalhados ao redor do mundo. Até agora a Dow não conseguiu ser um exemplo positivo e seu descaso em assumir a responsabilidade é um modelo para aqueles que pensam que as vítimas desse tipo de herança química podem ser abandonadas a sua própria sorte.

(2) AaCcTt: Bhopal (Ação contra Crimes Corporativos e Terrorismo Tóxico: Bhopal) é uma aliança internacional para promover a Justiça em Bhopal e um futuro livre da contaminação tóxica. A coalizão inclui organizações de sobreviventes da tragédia de Bhopal como a Gas Peedit Nirasharit Morcha (Bhopal), a Gas Peedit Mahila Stationary Karmachari Sangh (Bhopal), além do Grupo para Informação e Ação, da Campanha Nacional para Justiça em Bhopal (Mumbai), da A Outra Midia (Nova Delhi), CorpWatch e do Greenpeace.

(3) Informações e relatórios técnicos sobre casos de contaminação ambiental podem ser encontrados no site da campanha de tóxicos do Greenpeace Brasil ou no hotsite da Agência Estado, no ar desde o dia três de maio: www.estadao.com.br/ext/ciencia/zonasderisco.

http://www.greenpeace.org/brasil/toxicos/noticias/greenpeace-bhopal-o-descaso

quarta-feira, 18 de março de 2009

História econômica começou com transporte de banana

Da Reportagem de A Tribuna 14 de julho de 2002

A Escola Estadual Luís Beneditino, situada na Rua Santo Amaro, guarda parte da memória da comunidade. Segundo pesquisas dos professores desenvolvida com os alunos do Ensino Fundamental, a economia do Sítio, no passado, foi fundamental para o antigo Itapema, devido ao transporte de bananas, que ‘‘partiam das várzeas da ilha, passavam pelas gamboas (braços de mar), do Sítio Conceiçãozinha, nos trapiches de embarques existentes no bairro, em 1902’’.

Conforme se apurou, os habitantes eram caiçaras, ‘‘mestiços de escravos e portugueses com índios que viviam nas beiradas dos manguezais e das várzeas de onde tiravam seu sustento, caçavam e viviam da pesca e do cultivo da banana’’. Ainda segundo o pesquisa dos professores, o nome Sítio Conceiçãozinha fora dado pelas jeusuítas. Até os anos 60, as pessoas visitavam a Capela da Virgem Aparecida, semidestruída, nas margens do Rio Santo Amaro.

Na década de 30, o Sítio quase se transformou no primeiro aeroporto da Baixada, com o lançamento da pedra fundamental da Base Aérea. Conta-se que nessa época, além da pesca, o artesanato se constituía em outra fonte de renda das famílias, com a confecção de balaios e cestos, alem de chapéus tipo sombreiro, tudo vendido nas embarcações e navios e, mais recentemente, nas praias. Conforme a pesquisa dos estudantes, o material para confecção dos materiais era tirado das matas nativas.

O sítio era coberto de árvores frutíferas, como jenipapo (que serve para fazer vinhos e licores), cajás, mangas, caquizeiros, jaqueiras e goiabeiras, entre outras. Na década de 60, o Sítio começou a sofrer ataques especulativos de empresários. Era criada a Geloflocos, empresa construída às margens do Estuário, trazendo uma ocupação desordenada. Em seguida, vieram a Dow Química, Iate Club, Cutrale, Cargill, Tecon.

Cemitério

Para Nílton Rafael, da Unipesc, há indícios de ocupação na área em 1898. Segundo afirma, o cemitério indígena, para muitos uma lenda, teria existido na área hoje ocupada pela Dow Química. Conforme o integrante da Unipesc, os laços cristãos com a comunidade se fortaleceram com a construção da Capela Nossa Senhora Aparecida de Conceiçãozinha, nos anos 70. Mas a primeira missa foi rezada ao ar livre, ao abrigo de um pé de jambolão, anos antes, árvore que tempos depois caiu, originando o nome ‘‘missa do pau deitado’’.

Hoje, com o apoio da Sociedade Melhoramentos do Sítio Conceiçãozinha (Somecon), e da E.E. Luís Beneditino, a comunidade desenvolve ações de conscientização ambiental. É uma tentativa de impedir o que aconteceu com o Rio da Pouca Saúde, que corta o núcleo. Assoreado e cercado de palafitas, esse braço de mar ainda respira graças ao trabalho de mutirões de limpeza constantes no núcleo.

Guarujá - BairrosProf. Silvio Araujo de Sousa